Brasil

 NOVA FACÇÃO: Comando Evangélico

A facção ‘evangélica’ que emerge como terceira força do crime organizado do Brasil

Três agentes da Polícia Militar (PM) do Rio de Janeiro arremessam uma estrela de Davi enorme do alto de uma caixa d’água em Parada de Lucas, na Zona Norte da cidade.

Fonte BBC –  Camila Veras Mota

Até ser destruído em uma operação da PM no último dia 11 de março, o símbolo de neon brilhava forte à noite, avisando a quem o avistasse que aquele era o Complexo de Israel: o conjunto de cinco comunidades na zona norte do Rio dominadas pelo Terceiro Comando Puro (TCP), facção que nos últimos anos ficou conhecida pela presença de traficantes que se dizem evangélicos.

Na mesma operação policial, os agentes demoliram um imóvel de luxo do chefe do tráfico no local, Álvaro Malaquias Santa Rosa, conhecido como “Peixão”, um “resort” erguido em uma área de proteção ambiental dentro do complexo.

Peixão, contudo, não foi preso. Na verdade, ele nunca passou pelo sistema carcerário. Com 39 anos, sua figura é cercada de mistérios e perguntas em aberto. Não se sabe, por exemplo, qual sua história de conversão. Alguns relatos dizem que ele é pastor, outros que virou evangélico por causa da mãe.

Fato é que a queda da estrela de Davi no topo da caixa d’água em Parada de Lucas foi mais simbólica do que prática.

A facção, na verdade, está em franca expansão, como relatou o coordenador-geral de análise de conjuntura nacional da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Pedro Souza Mesquita, em uma reunião da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência no Congresso no início de novembro.

No último ano, o TCP foi além dos limites do Rio de Janeiro e chegou a Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Bahia, Ceará, Amapá, Acre, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, conforme o levantamento feito pela Abin.

Um crescimento que, nas palavras de Mesquita, o coloca como “terceiro grupo emergente no contexto nacional”, depois do Comando Vermelho (CV), do qual é rival declarado, e do Primeiro Comando da Capital (PCC).

Uma das últimas fronteiras cruzadas pela facção foi a do Ceará. Há cerca de três meses, a estrela de Davi que virou marca do grupo começou a aparecer em locais como Maracanaú, na região metropolitana de Fortaleza, ao lado de pichações com dizeres como “Jesus é dono do lugar”.

Em outubro, correu a notícia de que pelo menos quatro terreiros de umbanda na cidade haviam sido fechados a mando da facção, que há anos exercita um amplo repertório de práticas de intolerância religiosa na zona norte do Rio.

O delegado-geral da Polícia Civil do Ceará, Márcio Gutiérrez, disse à BBC News Brasil que os casos ainda estão sendo investigados.

Ele afirmou que a presença do TCP no Estado foi identificada pelas autoridades locais em setembro, mês em que 37 membros do grupo foram presos só na região metropolitana.

Ainda segundo Gutiérrez, a entrada do TCP no Ceará se deu por meio da aliança com uma facção local, um expediente também bastante utilizado por CV e PCC em seus respectivos processos de nacionalização.

“Esse é o movimento padrão de expansão das facções criminosas, que é de incorporação dos grupos locais”, diz Carolina Grillo, coordenadora do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF).

“Pequenas facções locais acabam se beneficiando de se aliar a essas grandes facções porque elas entram em redes de solidariedade, de contato para compra de drogas, de armas, de suporte em situações de rivalidade.”

No caso cearense, o grupo é o Guardiões do Estado (GDE), facção que ficou conhecida pelos assassinatos violentos de rivais e que, em disputa por territórios com o CV em 2017, transformou a região metropolitana de Fortaleza na área com maior taxa de homicídios do país, de 86,7 para cada 100 mil habitantes.

Em janeiro de 2018, membros do GDE invadiram uma festa e mataram 14 pessoas, a maior chacina do Estado. Depois disso, em meio a intensa repressão de autoridades locais, com a prisão de vários líderes, o grupo entrou em derrocada.

Foi nesse contexto de enfraquecimento que membros da facção passaram a aderir ao TCP. Essa aproximação, segundo as investigações, se deu a partir da migração de lideranças do GDE do Ceará para o Rio de Janeiro, onde tiveram contato com líderes do TCP e passaram a costurar a aliança.

“A gente tem informações de inteligência que precisa manter sob sigilo, mas essas lideranças têm papel fundamental. São as pessoas que orientam e que determinam como aquele grupo criminoso vai atuar, as cooperações e as novas formas de financiamento”, afirma Márcio Gutiérrez.

Desde setembro, a Polícia Civil vem monitorando “as consequências e desdobramentos dessa aliança”. “Temos feito diversas capturas e compreendido o método [de atuação da facção]”, completa o delegado-geral.

Continue lendo no Link –  https://www.bbc.com/portuguese/articles/c5yly261j5qo

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