
Sobre o autor
Teresinha Matos
AdvogadaAdvogada e especialista em previdência e apresentadora do Idade Brilhante. Fala sobre política e direitos da terceira idade, promovendo inclusão e qualidade de vida.

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o pagamento de honorários no valor de R$ 233 milhões a dois advogados que atuaram em um acordo bilionário entre a mineradora Vale S/A e a comunidade indígena Xikrin levanta um debate crucial sobre a segurança jurídica da advocacia no Brasil.
Embora o STF tenha justificado a medida com base no “risco de grave lesão à segurança pública” e no temor de novos conflitos na região, a decisão ignora um aspecto fundamental: a previsibilidade e a segurança das relações contratuais entre advogados e clientes.
Os advogados José Diogo de Oliveira Lima e Daniel Cavalcante dedicaram sete anos de trabalho para viabilizar o acordo que garantiu o repasse de R$ 2,3 bilhões aos Xikrin como compensação pelos danos ambientais causados pela mineração. Em contrapartida, tinham um contrato firmado, com previsão de honorários de 10% sobre o valor obtido, percentual comumente adotado em causas de grande complexidade.
A revogação da procuração dos advogados em 2021, posteriormente utilizada para questionar o pagamento dos honorários, não deveria servir como pretexto para negar a retribuição pelo serviço prestado. O Tribunal de Justiça do Pará (TJPA) reconheceu a validade da contratação e restabeleceu o percentual original, corrigindo a decisão de primeira instância que havia reduzido drasticamente o valor a ser pago.
A decisão do STF, ao suspender esse pagamento, cria um perigoso precedente que pode comprometer a atuação de advogados em causas de grande repercussão. Se um profissional do direito não pode confiar na segurança de um contrato e na previsibilidade de sua remuneração, qual incentivo restará para que ele se dedique a causas complexas e de interesse social?
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A advocacia é um pilar essencial da justiça, sendo indispensável à administração desta, conforme preceitua o artigo 133 da Constituição Federal. Ao afastar o pagamento de honorários previamente acordados, a Suprema Corte fragiliza esse pilar e abre margem para que advogados tenham suas remunerações relativizadas em prol de interesses políticos ou sociais.
Vale ressaltar que o pagamento aos advogados não interfere no repasse devido às comunidades indígenas. O reconhecimento da importância do trabalho jurídico é essencial para garantir que profissionais continuem a atuar com independência e confiança, especialmente em casos tão sensíveis e de grande impacto.
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Se a decisão do STF for mantida, poderá haver um efeito cascata, desestimulando advogados a se comprometerem com causas de relevância social e dificultando a defesa de direitos fundamentais de comunidades vulneráveis. O precedente que se desenha é, no mínimo, preocupante: quando a previsibilidade dos contratos é desconsiderada, a justiça se torna instável e imprevisível.
A classe advocatícia e a sociedade precisam refletir sobre os impactos dessa decisão. Se não houver segurança jurídica para aqueles que militam no direito, estará comprometida a própria eficácia da Justiça brasileira.
Teresinha Matos
Advogada